Lamento às Águas (Vilma Carla Martins)

Por Maria Clara Carvalho

Debruçar-se sobre o tema “memória” em 10 minutos de tela não é uma tarefa simples. É necessário convocar categorias da linguagem capazes de dar conta da profundeza temática com pessoalidade. Às luzes do cinema, a diretora Vilma Carla Martins se propõe a falar de memória em seu curta-metragem Lamento às Águas, de 2023. Segundo a diretora, o filme foi realizado após um processo de estudo, pesquisa e autoconhecimento, durante o qual esteve longe de Salvador. Todavia, ao assistir sua obra, parece que Salvador nunca saiu de Vilma. Lamento às Águas retrata de maneira sensível como a ancestralidade preenche a cidade de Salvador e atravessa Vilma. A leveza conduz o curta, construindo uma viagem visual na qual a memória revela-se intrínseca à textura das imagens, à voz que narra e ao que é dito por ela. Tal abordagem cinematográfica baseada na auto-referência, com tom performático e documental, leva o espectador a reconhecer e se enxergar nas dores narradas. Ao mesmo tempo que assistimos memórias coletivas e ancestrais, também vemos muito, ou quase tudo, de Vilma ali. A diretora fala de si, mas também fala de nós e das cicatrizes de um povo. Dessa maneira, com o movimento dado às fotografias e às memórias, as imagens acabam por comunicar muito além do que está exposto ou dito em tela.

Sob esse prisma, a viagem proposta pelo curta encarna um potencial transformador e curativo, capaz de amparar o espectador. É como se Vilma desse as mãos ao espectador e o levasse com ela em direção ao trauma e ao sofrimento, mas também à cura e ao conforto. A arte salva e cura as dores de um povo. O cinema de Vilma Carla atesta o espaço da arte e da fé para a humanidade. Como não sair de Lamento às Águas sem sentir uma fé em si mesmo, em seu povo e em sua memória?

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Uma resposta para Lamento às Águas (Vilma Carla Martins)

  1. Genivaldo disse:

    Excelente interpretação do curta.

    Parabéns Maria Clara.

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