Competitiva Nacional II

Quintal

Quintal, de André Novais Oliveira

Por Táric Marins

Quintal é o lugar ideal para tarefas domésticas, churrasco em família, acumular quinquilharias e – não menos importante – o espaço de brincadeira da criançada. O curta-metragem homônimo explora o lúdico possível desse ambiente do lar. André Novais Oliveira, diretor e roteirista, proporciona minutos de leveza e riso fácil combinando imaginação infantil com atrevimento adulto.

Os efeitos especiais de Gabriel Martins pontuam a história com esperteza e deixam o filme ainda mais divertido e surpreendente. O enredo é organizado no que parece ser uma colagem de realização de desejos do pai e mãe do diretor. Norberto Oliveira e Maria José Oliveira experimentam atuar tendo o filho como “fada-madrinha”; fazem bonito com a participação. O realismo fantástico de Quintal parece um conto de aventura que dá vontade de ser revisto.

Homemq que Virou
O Homem que Virou Armário, de Marcelo Ikeda

Por Táric Marins

Os procedimentos da rotina de trabalho, repetidos exaustivamente, diariamente, reduzem o homem à sua função apenas. Numa comédia quase muda, o curta faz referência argumentativa ao clássico Tempos Modernos (1936) – ainda relevante. O conteúdo é revisitado nas proporções de um escritório. Atos de funcionários e operários transfiguram-nos em objetos, que passam a ser parte do cenário inanimado.

Marcelo Ikeda rege o elenco com sua direção de forma coreografada e metódica. Direção de arte cria ambientação com objetos e signos que colaboram com a atuação e compreensão da ideia do filme. Os barulhos da movimentação cênica são compassados pelo trabalho de som, construindo musicalidade própria. A singeleza romântica é o toque final no curta.

Tropykaos
TROPYKAOS, de Daniel Lisboa

Por Táric Marins

Vivendo num ar condicionado

“Tropykaos é um retrato da minha geração.” A frase é do diretor Daniel Lisboa que, numa entrevista, fala sobre sua intenção com o seu primeiro longa-metragem. Empenhado em mostrar o que define como “lado B de Salvador”, traz roteiro para desconstruir as impressões que o senso comum – enviesado por novelas e propagandas – tem sobre a cidade; limitando a baianidade em estereótipo que não é sua temática cinematográfica, segundo ele.

Como ideia nuclear, o filme traz um poeta em crise, Guima (Gabriel Pardal), que acredita sofrer dum mal que chama “ultraviolência solar”. Sol e calor – tão celebrados pela publicitação comum na terra do verão – aqui são emblemas para aflição física e mental do protagonista. Fantasia e drama contam sua saga para aplacar essa agonia irremediável. Curiosamente, concentra sua resolução no alívio provido pelo aparelho de ar-condicionado.

Imagem e som conseguem ressecar e abafar o público no cinema, que acompanha o quase-herói em constante vertigem, na sua busca – que não é bem por inspiração poética ou coisa assim. Na obstinação de fechar-se numa “bolha de ar frio” se concentra Tropykaos.

Condicionado ao ar que não se renova – mas asfixia – Guima tem na voz da namorada (Manu Santiago) a fala sugestiva: “Vai por mim, seu problema é esse ar-condicionado”. A frase, quase terapêutica, tenta despertá-lo a implicar-se na verdadeira ultraviolência – que não é solar, ou de fora para dentro apenas –, suas questões estão, sim, condicionadas à fuga da vida real. Não há manual de instrução, plano de saúde, editais governamentais ou poções mágicas que possam poupá-lo da sua angústia. Locações de clausura e fotografia sinestésica constroem cenas que “adoecem” (para o bem).

O longo processo de operação do filme pode ter afetado no foco que incita. Roteiro inicialmente sugere um caminho perspicaz para arremate de uma metáfora complexa, digna de simbolizar na tela questões da classe média (antiga e nova). Mas se perde num resultado que valoriza, em closes e atuações, a denotação do calor pelo clima.

Protagonista minimiza a figuração ao justificar-se como tendo “uma genética que não é para viver nessa cidade”. O reforço da busca pelo objeto (ar-condicionado) deixa solto o argumento primordial.

Ainda assim, o filme pode ser visto como retrato de uma geração despreparada para enfrentar a realidade que é viver lá fora. Encarar a vida na sua complexidade é dor. A zona de conforto é fictícia – um ar a que se está condicionado – não há esquiva desse atributo de humanidade. A escolha de como lidar é livre, as consequências inevitáveis.

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